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Solidão com contentamento parece um grande oxímoro, mas é uma experiência possível (a foto acima parece tornar mais fácil aceitar isso). Mas para entendermos melhor o que isso significa, e se é realmente possível (e como), abaixo segue um trecho da definição da experiência de solidão serena como abordada pela monja Pema Chödron, em consonância com a abordagem terapêutica que usamos. Solidão com contentamento pode ser uma janela para uma dimensão não apenas de alívio e de cura, mas de compreensão profunda. Os temas diretamente conectados à essa solidão contente são a aceitação da experiência presente (de estar só), a ausência de ponto de referência, o abandono da vontade de fuga, e também a não criação de alternativas: o empenho sobre essas questões pode elucidar também as motivações íntimas que vinham distorcendo a experiência e tornando a solidão algo ruim, negativo e da qual se queria fugir ou evitar a todo custo.

Solidão com contentamento é a segunda das seis faces que Pema apontou como partes constituintes da experiência de solidão serena* — uma espécie de solidão saudável, por assim dizer — e que foram apresentadas no primeiro artigo aqui neste espaço, Virando a solidão de cabeça pra baixo: uma abordagem budista, por Pema Chödron. Relistando, as seis faces são (1) menos desejo, (2) contentamento, (3) evitar atividade desnecessária, (4) disciplina completa, (5) não vagar no mundo do desejo, e (6) não buscar segurança usando pensamentos discursivos.

Segue o trecho para sua apreciação:

“O segundo tipo de solidão é contentamento. Quando não temos nada, não temos nada a perder. Não temos nada a perder mas estamos programados em nosso instinto para sentirmos que temos muito a perder. Nosso sentimento que temos muito a perder está enraizado no medo — da solidão, da mudança, de qualquer coisa que não possa ser resolvida, de não-existir. A esperança que podemos evitar esse sentimento e o medo que talvez não possamos se tornam nosso ponto de referência. Quando desenhamos uma linha até o centro de uma página, sabemos quem somos se estamos do lado direito e sabemos que somos se estamos no lado esquerdo. Mas não sabemos quem somos quando não nos colocamos em nenhum dos lados. Então simplesmente não sabemos o que fazer. Simplesmente não sabemos. Não temos ponto de referência, nenhuma mão para segurar. Nesse ponto podemos enlouquecer ou nos assentar. O contentamento é um sinônimo para solidão, solidão serena, para relaxar com solidão serena. Desistimos de acreditar que ser capaz de fugir da nossa solidão vai nos trazer alguma felicidade duradoura ou alegria ou sentido de bem-estar ou coragem ou força. Geralmente tentamos desistir dessa crença um bilhão de vezes, de novo e de novo fazendo amigos com nossa pressa e pavor, fazendo a mesma coisa um bilhão de vezes com nossa consciência. Então, sem sequer notarmos, algo começa a mudar. Podemos estar simplesmente sozinhos sem alternativas, contentes de estar aqui com o humor e a textura do que está acontecendo”.
Pema Chödron

Caso não tenha lido o primeiro texto desta série sobre a solidão, que possui os links para a série completa das seis maneiras de experimentar a solidão serena, eis aqui: Virando a solidão de cabeça pra baixo: uma abordagem budista, por Pema Chödron.

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Foto de Barb Davids (licença de uso BY-NC-SA de Creative Commons, link)