A terapia está em transformação, numa crise de mudança e renovação. Um dos terapeutas contemporâneos mais conhecidos do mundo, o autor Irvin D. Yalom, de “Quando Nietzsche Chorou” e “A Cura de Schopenhauer”, escreveu um texto que mostra sua preocupação sobre essa transformação — que, segundo ele, está promovendo superficialidade e pressa à psicoterapia, duas características incompatíveis com a natureza desse importante trabalho sobre si mesmo. Se por um lado há um aumento significativo da busca por terapia nos últimos anos, o que indica a expansão e valorização dos processos de aprofundamento para todos as pessoas, por outro ela está sendo pressionada pelos movimentos do mercado (planos de saúde, por exemplo) e pela ansiedade por tratamentos rápidos e baratos. Assim, proliferam as consultas de 15 ou 30 minutos, os métodos “mágicos” de fim-de-semana e os remédios químicos sintéticos, todos em busca do prazo curto e da solução que não atrapalhe a agenda dos nossos tempos.

Isso é facilmente constatado pelas perguntas que muitos pacientes trazem aos primeiros contatos com a terapia: “quanto tempo dura?”, “quanto custa?”, “aceita plano de saúde?”, “quando estarei melhor?” e “podemos fazer quinzenal?”. Perguntas sensatas, obviamente, e nem todos buscam processos rápidos ou baratos. Mas o que está implícito é a angústia de ver-se curado e a incapacidade de entender que o processo não é um fármaco, que não atua em 15 dias, e tampouco é um projeto corporativo com data de início e fim.

JUNG falava que “o tempo é um fator insubstituível no processo de cura” (A Prática da Psicoterapia, pg 36). Parece que nosso modo de viver acelerado não é apenas um gerador de desequilíbrios e neuroses, mas de ansiedade e impaciência em relação aos próprios processos terapêuticos. A capacidade e empenho de estar em terapia já seria, assim, feliz ou infelizmente, uma parte da cura. Não estou tentando aqui advogar pelo processo longo, e sim pelo processo como ele é, seja curto, médio ou longo.

O que JUNG diz sobre o tempo do processo: “O procedimento é necessariamente muito trabalhoso e demorado. É certo que se fazem muitas tentativas no sentido de abreviar ao máximo a duração do tratamento, mas não se pode afirmar que os resultados tenham sido animadores. Porque quase sempre as neuroses são produtos de uma evolução defeituosa, que demorou anos e anos para se formar, e não existe processo curto e intensivo que a corrija”.

Veja o texto de Irvin D Yalom:

“Oferecer orientação e inspiração para a nova geração de psicoterapeutas é extremamente problemático hoje, porque nosso campo (de psicoterapia) está em crise. Um sistema de saúde orientado à economia exige uma mudança radical no tratamento psicológico, e a psicoterapia é agora obrigada a ser racionalizada — isto é, sobretudo, a ser barata e, forçosamente, breve, superficial e insubstancial.

(…) Psiquiatras jovens são forçados a se especializarem em psicofarmacologia porque os terceiros pagadores agora reembolsam a psicoterapia somente se for entregue por praticantes baratos (em outras palavras, treinados minimamente). (…) O que dizer dos treinamentos de Psicologia Clínica – a escolha óbvia para preencher esse espaço? Infelizmente, os psicólogos clínicos estão enfrentando as mesmas pressões de mercado, e a maioria das escolas de doutorado estão respondendo por ensinar uma terapia que é orientada-ao-sintoma, breve, e, assim, reembolsável.

Por isso me preocupo sobre a psicoterapia — sobre como ela pode ser deformada pelas pressões econômicas e empobrecida por treinamentos radicalmente breves. Mesmo assim, estou confiante que, no futuro, uma nova classe de terapeutas vinda de uma variedade de disciplinas educacionais (psicologia, aconselhamento, serviço social, aconselhamento pastoral, filosofia clínica) continuará a perseguir treinamentos de pós-graduação rigorosos e, mesmo na crise dos serviços de planos de saúde, encontrará pacientes desejando um crescimento extensivo e mudança ao se comprometer com uma terapia aberta.”

Isso foi escrito em 2002. Essa previsão está em consolidação neste momento, e parece haver uma boa e uma má notícia. A má é que a Psiquiatria não está dando conta de tantos pacientes entrando em tratamento e usando fármacos, pois há uma explosão de diagnósticos de ansiedade, depressão, transtornos, distúrbios e outras condições. A boa notícia é que o aumento da busca por terapia não necessariamente encurtou tanto os tratamentos nem barateou exageradamente os serviços, pois há pessoas suficientemente interessadas e que compreendem a característica dinâmica e imprevisível do processo — se por um lado ninguém quer ficar mais 10 anos em terapia, como acontecia nos Anos 80, também há um entendimento que 3 meses de terapia não são suficientes para nenhum movimento de substância e profundidade.

Mas o alerta de Yalom continua valendo, e é necessário que tanto terapeutas quanto pacientes continuam buscando o caminho do meio, se adaptando à realidade sem distorcer ou mutilar processos tão importantes quanto o trabalho interior que acontece em terapia.

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